sábado, 8 de setembro de 2007

Mais sobre os velhos...



O DRAMA DOS IDOSOS e-mail
Jorge Lage

Li num dos últimos Notícias de Chaves que os lares de idosos não deviam ter quartos individuais para, assim, poderem armazenar mais, dado haver muitos velhos à espera de vaga, um pouco por todo o lado. Do meu ponto de vista os que estão no outono da vida, e muito mais os que aguardam a morte na fragilidade do seu feixe de ossos, só em último recurso deviam recorrer aos lares, a que outros chamam de asilos ou depósitos de velhos.

Agora começo a perceber por que razão o Provedor da Misericórdia de Mirandela terá dito em público que o lar devia ser o último recurso. Achei de grande nobreza defender tal ideia por me parecer a mais acertada.
O que me parece é que um lar é um lar, como uma prisão é sempre uma prisão, por mais que se pintem. Sendo assim, tudo o que se faça para dar conforto aos que para lá são ‘empurrados’ nunca será de mais.
Há 40 anos só ouvia falar em asilos e eram muito poucos, era quase uma desonra, para gente de bem, deixar ir para lá os seus. Hoje pintaram-nos melhor e acrescentaram-lhes mais algum conforto mas não mudou a sua essência: despejar lá os velhos, à espera que eles morram.
Afinal porque é que há tanta gente encaminhada para os lares? Uns não têm família que possa cuidar deles, outros a família não os quer por perto e outros não podem cuidar dos seus. Acaso um filho poderá pagar tudo o que os pais fizeram por ele?
Recordo-me que amigos meus tinham a mãe viúva, que morava num recanto da aldeia e tinha por vizinha uma filha numa casa de frente, sem ninguém a seu cargo, porta com porta. A mãe não queria ir para o lar, os restantes filhos até estavam dispostos a pagar-lhe, para lhe dar uma tigela de sopa. Até era uma aldeia que tinha lá pessoas capazes de a apoiar (limpeza e fazer a comida) a troco de uma remuneração, mas a cultura dos novos depósitos de velhos a que chamam ‘lares’ falou mais alto.
Parece já não haver uma cultura/sentimento de família e os idosos quando deixam de trabalhar ou dão os primeiros sinais de senilidade são desalojados do seu ninho e atirados para os depósitos, mais ou menos confortáveis. Quem para lá vai, na sua maioria, sabe que vai ao encontro da morte.
Hoje, quando morrem, já não se vela o corpo dos idosos que partem e agora chegou a ideia ‘saloia’ às aldeias de fazer morgues em tudo o que é canto, quebrando uma tradição de solidariedade e de respeito pelo cadáver e pela memória de quem parte.
O que me parece, em muitos casos, se houvesse um maior apoio domiciliário a idosos, por parte do (des)governo central, muitos nunca entrariam nos lares e haveria, em muitas aldeias, quem quisesse prestar alguns cuidados a troco de uma remuneração. O problema maior é a insensibilidade do governo (ou dos políticos), que só dá apoios a quem vai para os depósitos de velhos. Desde que precisassem de cuidados, independentemente de quem os prestasse, devia ter direito a remuneração, nem que fosse menor que a dos lares. Afinal, não há amas para as crianças?
Depois, também há quem prefira pagar 300 contos num depósito dourado, que não deixa de ser depósito, em vez de dar 100 ou 120 a quem cuide do/a velhinho/a na sua residência.
Não quero com isto dizer que os lares não são necessários, bem pelo contrário (são um imenso bem), mas não deviam ser a regra, mas a excepção. Só em último recurso é que os idosos deviam ir para os lares. Devia ser encorajado, monetariamente, a permanência no seu meio familiar e social, socorrendo-se dos recursos locais.
O (des)governo e todos os que assim procedem estão a contribuir para uma sociedade mais desumanizada e injusta, desprovida de valores, para com aqueles que deram o melhor de si por nós. Mas, ironia das ironias, estamos a cavar o nosso destino que será ainda mais cruel que o dos idosos de hoje. É uma questão de anos e a maioria de nós será posta no depósito da morte para vivos-mortos.
Não se aflijam os que acham que os lares são poucos, porque dentro de uma década, vão surgir os primeiros indícios de que os lares irão sendo convertidos em alojamentos turísticos. Vai verificar-se um fenómeno como o da natalidade de hoje, só que mais retardado. Se o poder local e as IPSS fizessem pressão junto dos políticos no poder, estes seriam capazes de diversificar o apoio aos idosos, que devia ser mais de proximidade do que o actual apoio domiciliário pontual e oficial.

Publicado no Notícias de Chaves em 3/8/2007

Jorge Lage

Jorge, e aqueles que mandam os seus para esses depósitos pq não servem
mais aos seus propósitos? Ou ainda, pq querem apoderar-se de seus bens ou
economias, resultado de uma vida inteira de trabalho?
Se para esses, a justiça dos homens não fornece castigo, quero acreditar que
funcione a justiça divina, seja lá o que tal expressão signifique (independente do significado
que as religiões dão a ela...).
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