Thursday, February 22, 2007

GRÁVIDA

Uma das melhores épocas da minha vida: terceira gravidez, terceira vivência de maternidade, aventura sempre repleta de emoções, as mais variadas.



Passei por essa experiência com mais de 40 anos e garanto que me saí muito melhor nas minhas funções maternas do que aos 20...

A mãe fotografada acima, certamente, não pensa igual a mim sobre as delícias e alegrias da maternidade. Mas ela, certamente, quer que seu filho sobreviva, desejo de qualquer mãe, até das irracionais. Apesar da quase ausência de energia nos olhos de ambos, eles estão vivos, existem.

Daria para conversar com essa mãe sobre aleitamento materno, fraldas descartáveis, vacinação? Coisas que para uma grande parte das mães é um assunto básico, para ela é tema inexistente...

A desigualdade que nos separa é a chave para entender nossa sociedade atual: minha bem nutrida aparência de capitalista x sua disforme figura de marginal do sistema.


Mãe aos 14 e aos 40, fenômeno da desigualdade

Em Recife, aos 14 anos, Amanda Carla da Silva deixou de brincar de queimado porque, grávida, tem medo de machucar a barriga. Espera o primeiro filho. No Rio, a professora Maria Alice Nogueira foi mãe de Letícia aos 39, depois de estudar e se estabilizar profissionalmente. Num Brasil em que as mulheres, maioria na população, estão tendo menos filhos, cresce o número de mulheres que são mães nos extremos da fase fértil: dos 10 aos 14 anos, numa explosão de gravidez adolescente que preocupa as autoridades de saúde, ou, num fenômeno dos centros urbanos, dos 40 aos 49, na chamada "última juventude".
O perfil das mães brasileiras divulgado pelo IBGE com base no Censo 2000 alerta que, de 1991 a 2000, o número de jovens de 10 a 14 anos que foram mães pela primeira vez quase duplicou: subiu 93,7%. O segundo maior aumento foi na faixa de 15 a 19 anos, 41,5%. As brasileiras estão tendo filhos mais cedo e a idade média das mulheres que foram mães pela primeira vez caiu de 22 anos, em 1991, para 21,6 anos, em 2000. Segundo o IBGE, 32,5% dos bebês nascidos em 1991 eram filhos de mães com idades entre 10 e 19 anos. Em 2000, a taxa chegou a 38%.
No outro extremo da idade fértil, as quarentonas também têm histórias para contar nesta véspera de Dia das Mães. Na faixa de 35 a 39 anos, o número de mães pela primeira vez subiu 46% de 1991 a 2000. O crescimento também foi expressivo dos 40 aos 49 anos: 26,9%.
Gravidez aos 14 e aos 40 é um fenômeno que fala sobre a desigualdade como marca social brasileira e precisa ser interpretado a partir de um conjunto de fatores, diz Juarez de Castro Oliveira, gerente de Estudos e Análises de Demografia do IBGE:
"A gravidez adolescente está muitas vezes associada à baixa escolaridade e à baixa renda. Alerta também para o despertar mais precoce da sexualidade. Já as mulheres com mais de 40 anos têm situação financeira estável e escolaridade alta. É uma mulher que optou por estudar e trabalhar, deixando para mais tarde a opção de ter um filho".
Das mães de 10 a 14 anos, mais de 80% engravidaram no ensino fundamental: 30,2% tinham de um a três anos de estudo e 53,19% tinham de quatro a sete anos de estudo. Um quarto (25,29%) não tinha rendimento algum, e 52% vêm de famílias com renda mensal de até três salários-mínimos.
Oliveira alerta para o fato de, para muitas adolescentes, a gravidez ser resultado não apenas da falta de informação sobre métodos contraceptivos, mas da busca por auto-estima. Muitas vezes, para uma jovem que não se interessa pela escola nem tem perspectiva de crescimento profissional, ser mãe é uma forma de encontrar seu lugar no mundo e ter relativa independência em relação aos pais.
Outro dado que chama a atenção dos pesquisadores é o fato de 54,74% das garotas de 10 a 14 anos terem dito que vivem ou já viveram em união, um termo que abrange casamentos "no papel e na Igreja" ou não, as chamadas uniões estáveis: "O que é "viver em união" para quem tem menos de 14 anos? Relações céleres, rápidas, como namoro rápido ou simplesmente ficar estão sendo encaradas de forma surpreendente. A gravidez adolescente é um problema sério, e vale lembrar que é também de alto risco para a mãe e o bebê " diz Oliveira.
Tão preocupante que, em Alagoas, em 2000, 18,5% das mães de 10 a 14 anos tinham ao menos dois filhos nascidos vivos. Em outros estados do Nordeste e do Norte - Sergipe, Bahia, Pernambuco, Amapá, Rondônia e Acre - o quadro da maternidade precoce se repete.
O perfil da mãe de mais de 40 anos é outro: 79,03% vivem ou viveram em união; 58,81% são economicamente ativas; 25,73% vivem em famílias com renda superior a dez salários-mínimos e 59,07% têm mais de oito anos de estudo. Esse tipo de gravidez também é considerado de risco. Mulheres que passaram pela gravidez perto dos 40 falam da mudança que o filho causou no foco de vida. É o caso de Maria Alice Nogueira, hoje com 40:
"Sou de uma geração de mulheres que se dedicaram muito ao trabalho e ao estudo. Viajei, morei fora. Até que pensei, ufa! Está na hora de pensar em ter filho. Vejo que foi no tempo certo, depois de ter vivido muitas coisas que eu queria e conhecido a pessoa certa".
"Era o trabalho acima de tudo. Depois do filho, é o filho em primeiro lugar. Eu gostaria de ter outro, mas, quando vejo pelo lado da idade, não dá mais."
Para as mães de mais de 40 que se preocupam em não ter saúde para ver os filhos crescerem, o IBGE tem uma boa notícia. Em relação ao início do século XX, quando a mulher tinha de ter filhos bem cedo porque morria jovem, a expectativa de vida era de 34 anos; a esperança de vida dobrou: a brasileira vive hoje em média 72,6 anos.

(O Globo) maio de 2005

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