segunda-feira, 1 de março de 2010

E não se mata cavalo?


A 26ª Cavalgada do Mar, que acontece todos os anos no litoral gaúcho, tem provocado polêmica depois que o cuidado inadequado provocou a morte de dois equinos e deixou doentes outros 15, no sábado passado (20/02/10).
Para os protetores dos animais, o calor excessivo, a falta de preparo e as longas distâncias configuram crueldade. Em Carta Aberta, as entidades afirmam que "o dito companheiro do gaúcho, um dos símbolos do pago, está sendo vilipendiado (...) por tradicionalistas de fim de semana" e pedem o fim imediato da cavalgada. Tradicionalistas dizem que quem preserva as tradições de verdade não cavalga com sol a pino.

Tradicionalistas como Paixão Côrtes, que disse em entrevista na ZH de 26/02/10:

"O folclorista Paixão Côrtes, a maior autoridade em tradicionalismo gaúcho, viu apenas as pegadas deixadas pela Cavalgada do Mar deste ano. O evento não o entusiasma. Apesar de achar a ideia boa, ele considera que ela é desperdiçada pela falta de conhecimento e de propósito: "As cavalgadas podem chamar a atenção à ligação entre o gaúcho e o cavalo no movimento tradicionalista. Assim como existem apresentações de danças, podem ocorrer essas demonstrações de cavaleiros. É salutar, quando bem organizada. Mas bem organizado significa ter objetivos e não simplesmente montar no cavalo sem perspectivas maiores. Passo um bom tempo aqui em Cidreira e não vejo razão de ser nessas cavalgadas. É simplesmente uma caminhada a cavalo. Não há pesquisa ou questionamento sobre nada. Não serve para questionar os problemas do Rio Grande. É um passeio. É comer, beber e dar risada."

Leiam a entrevista na íntegra:
http://www.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default.jsp?uf=1&local=1&section=Geral&newsID=a2821614.xml

Já o intelectual Juremir Machado da Silva, aproveitou a polêmica para atacar a secretária da Cultura, Mônica Leal, fato que pode-se observar em boa parte do seu texto publicado no Correio do Povo de 25/01/10:

"(...) A secretária da Cultura, Mônica Leal, está contribuindo para maltratar cavalos na beira do mar. Ela é entusiasta desse tipo de ação cultural. Enquanto ela ajuda a estafar cavalos, sentindo-se uma nova Anita, a cultura do Rio Grande do Sul estrebucha. A sala de cinema Norberto Lubisco foi fechada. Tem cinema no shopping. Voltaire Schilling, um dos nossos intelectuais mais brilhantes e tradicionais, foi demitido da direção do Memorial do Rio Grande do Sul. Parece que ele não tinha o que conversar com a chefe. Afinal, não é de andar a cavalo na praia com sol quente. A casa está caindo, os cavalos morrendo, o circo pegando fogo. Mas a secretária Mônica Leal está firme na montaria. Sempre. Ela é dura na queda. Corresponde a todos os clichês imagináveis.

Agora, entre nós, há sem dúvida um ponto obscuro, um elemento que exige investigação séria: por que mesmo Mônica Leal tornou-se secretária da Cultura? É um tempo estranho este. Quando não há mais necessidade alguma de movimento, todos querem se deslocar. Especialmente pelos meios mais anacrônicos. Pode haver algo mais excitante do que permanecer no lombo de um cavalo, com o sol a pino, até o bicho morrer? Tudo isso em nome da tradição! Os franceses do século XVIII usavam perucas empoadas. O Ministério da Cultura da França devia lutar pela recuperação dessa tradição eliminada pela modernidade. Vou comprar um cavalo para matar na próxima cavalgada."

Leiam o texto na íntegra:
http://www.correiodopovo.com.br/Impresso/?Ano=115&Numero=148&Caderno=0&Noticia=103734

E Paulo Sant'ana, polêmico cronista gaúcho, não poderia ficar fora da discussão; hoje, escreveu no seu espaço em ZH:

"A cavalgada da gordura!

Qual o sentido da Cavalgada do Mar? Depois que morreram dois cavalos e 15 adoeceram no primeiro dia da cavalgada, acendeu-se a polêmica.
Fui me socorrer no nosso mais importante tradicionalista. O folclorista Paixão Côrtes não vê propósito nessa cavalgada. Disse mais: que cultuar a tradição não é só cantar, dançar e beber.
As entidades de proteção dos animais protestam.

Pensando bem, parece tanto ridículo quanto cruel submeter os cavalos ao percurso de 240 quilômetros em oito dias. Ainda por cima, cada um com um cavaleiro no dorso. É desumano. Se já o é para o cavaleiro, imagine para o cavalo.
Some-se a isso a época por todos os títulos inadequada, calor sufocante e sol escaldante.

(...) Não resta dúvida, tem de suspender essas cavalgadas, imediatamente. Não sou eu, alienado, que estou dizendo. É o Paixão Côrtes, minha gente!

Tem de acabar para sempre esse irracional exibicionismo para os banhistas."

Leiam a coluna na íntegra:
http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a2824224.xml&template=3916.dwt&edition=14204&section=70


Minhas reflexões:
Cavalos em carroças, em cavalgadas, em batalhas, em competições - nada disso deveria acontecer com eles! Animais deveriam permanecer selvagens, longe do domínio do ser "humano".
Como esses belos exemplares da raça equina, livres e integrados com seu habitat natural!




Atualizando:
Já na crônica do dia seguinte (02/03/10), Paulo Sant'ana arrepiou, baixou a bola, suavizou o tom (imagino os milhares de telefonemas e e-mails recebidos de leitores indignados - não esqueçam que gaúcho/cavalo/churrasco de carne de vaca é um trinômio inseparável!) e escreveu que "Cavalgada do Mar precisa de fiscalização e organização", já que "cavalo também é veículo":

"Eu escrevi ontem contra a Cavalgada do Mar, mas fiquei com um remorso: afinal, sou gaúcho, respeito o culto às tradições e posso tê-lo agredido com meu texto. Então, quero contemporizar. Admito a Cavalgada do Mar, desde que ela seja organizada.
Alguém tem que se responsabilizar pelo trânsito dos animais e dos cavaleiros no longo percurso.
Sem exame dos veículos, sem inspeção dos veículos, no caso os cavalos, não vai dar para continuar".

Para ler na íntegra:
http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a2825235.xml&template=3916.dwt&edition=14210&section=70

Então, saiu pela tangente, para agradar gregos e troianos.
Só os cavalos continuam sendo desmerecidos, humilhados, dominados, açoitados, chegando ao nível de serem denominados "veículos".
E segue o baile...

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