Tire a venda dos seus olhos e aproxime-se! Leia nas entrelinhas e procure ver através do brilho da ilusão, pois vivemos como mansas ovelhas agrupadas em um rebanho comandado por meia dúzia de pastores. Atreva-se a mudar sua posição, pois a Verdade não é aquela que nos mostram e obrigam a viver, através das mais variadas artimanhas e armadilhas. Faça diferente! (Vera Falcão)
sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008
Entrando na Escola Pública
Minha filha apanhou no recreio da escola.
Por ela me transformei em Mãe Voluntária!
Escrevi esse depoimento há dois anos atrás, quando minha filha entrou para a primeira série do Ensino Fundamental, em uma escola pública.
Espero que ele auxilie aos pais que também estão
embarcando nesta viagem.
Ambas ansiosas, eu e minha filha de seis anos, Ísis, vimos o mês de março de 2006 chegar.
Uma nova fase iniciaria em nossas vidas, pois aproximava-se o momento em que ela iria cursar a primeira série numa escola pública.
Meus dois filhos mais velhos estudaram em escola particular e, pelo que recordo, meu envolvimento na rotina dessa instituição resumia-se às reuniões trimestrais, quando ia receber as avaliações das crianças. Escola, para mim, era um local essencialmente cuidado, dirigido e administrado por professores, funcionários e direção e o envolvimento dos pais acontecia nessas reuniões ou quando solicitavam cooperação para organizar festas.
Minha filha caçula é uma criança doce e comunicativa. Desde os três anos, participa de aulas de pintura, música, teatro e dança e gosta bastante de interagir com os colegas. Nessas oficinas, raramente acontecia alguma desavença entre as crianças, apenas aquelas tidas como "normais" em relacionamentos.
Não tinha uma idéia concreta de como era a rotina numa escola pública nos dias atuais.
Estava curiosa para saber.
Confusão no recreio
Primeiro dia de aula é emocionante.
Mochila recém-comprada, cheia de material escolar com cheirinho de novidade, a roupa escolhida na véspera com cuidado.
Medo, ansiedade, curiosidade misturados: como será a professora, os colegas serão novos amigos? Todo aluno em seu primeiro dia de aula fica com a cabecinha repleta de dúvidas e expectativas.
Durante o primeiro mês, Ísis teve os contatos iniciais com os colegas.
Ao chegar em casa, ela me relatava tudo que acontecia na sua manhã na escola e já tinha dito que as crianças de sua turma era muito briguentas e desobedientes, que a professora estava sempre gritando e reclamando, pedindo que se comportassem.
Ela se mantinha um tanto afastada, pois seu temperamento é tranqüilo e costuma obedecer quando solicitada.
O primeiro problema surgiu durante o recreio.
Numa certa manhã, quando fui buscá-la, me contou que apanhara de colegas de sua turma, levando vários pontapés. No pátio, pedira ajuda e não a encontrara. Fiquei espantada ao saber que uma criança apanha, pede socorro e não o recebe, num local onde deveria ser protegida.
Em casa, verifiquei suas pernas e realmente, haviam muitas manchas roxas.
Liguei para o pai dela (não vivemos juntos), relatando o acontecido, mas ele não podia ir à escola no dia seguinte. É claro que eu não deixaria de ir, mal consegui pegar no sono, de tanta pressa para reclamar sobre o caso.
Na outra manhã, fui nervosa falar com a professora.
Os alunos formavam filas na entrada da escola, aguardando o sinal do início das aulas. Assim que a professora chegou, abordei-a. Ela estava bastante chateada com o ocorrido, mas logo percebi que a turma era indisciplinada. Enquanto conversávamos, as crianças ficavam na fila chutando-se e empurrando-se.
Vendo que não resolveria nada ali, decidi procurar a direção, mas era necessário marcar um horário para ser recebida.Voltei para casa preocupada, imaginando se outro episódio de violência iria ocorrer no recreio.
Enquanto aguardava o encontro com a direção, Ísis apanhou novamente de um colega, sendo incomodada por ele dentro da sala de aula. O garoto empurrou sua mesa e ela caiu com a cadeira para trás, estatelando-se no chão. Quando me contou, fiquei fervendo de raiva. Não estava preparada para isso. Eduquei minha filha para ser pacífica, para não agredir e não imaginava que crianças pequenas pudessem ter tanta agressividade dentro de si.
Ia ter que mudar meus conceitos sobre convivência social.
Uma outra realidade
Novamente, mal pude conciliar o sono.
Na manhã seguinte, levantei da cama antes do despertador tocar. Chegando à escola, fui direto às filas e procurei o menino que a empurrara. Perguntei porque ele fizera aquilo e ele ficou evitando meu olhar, mudo. Insisti no diálogo, mas ele permaneceu totalmente calado.
Conversando novamente com a professora, notei que ela continuava aborrecida, mas estava longe de encontrar uma solução para os problemas de indisciplina da sua classe. O menino nem ao menos fora punido, apenas advertido. Eu tinha que tomar alguma atitude mais eficiente.
Antigamente, se você fizesse algo errado dentro da escola receberia algum castigo, poderia ser até expulso. Parece que hoje, os alunos são advertidos de uma forma muito benevolente. Talvez um reflexo do que acontece em outros níveis na sociedade, onde as pessoas cometem crimes e não recebem punição, continuam circulando livremente e repetindo suas safadezas.
Entrei na escola e fiquei andando pelos corredores, para criar uma intimidade que eu não tinha com ela. Então vi duas mulheres conversando, encostadas no corrimão da escada.
O que me chamou atenção nelas era que usavam um crachá onde se lia "mães voluntárias". Me aproximei, perguntando o que significava aquela expressão. Disseram que ajudavam a "cuidar do recreio". Fiquei interessada e contei o que tinha acontecido com a Ísis. Responderam que essa situação era comum, pois a escola possuía apenas uma monitora para atender um grande número de crianças durante o recreio.
Nesses 15 minutos diários, no pátio onde brincam as séries iniciais, participam 9 turmas, sendo que em média cada uma delas tem 20 crianças. Por alto, são quase 200 crianças! Para uma funcionária apenas! Então, pude entender porque a violência explodia nesses momentos.
As mães voluntárias são mães de alunos que, em vista dessa situação, buscavam colaborar com a escola. Mesmo assim, as dificuldades permaneciam, pois sendo em pequeno número, não conseguiam atender a todas as necessidades. Elas se reuniam no CPM (Círculo de Pais e Mestres), numa salinha perto de onde estávamos. Convidada a entrar, aceitei prontamente, pois estava em busca de uma solução urgente e prática.
Para mim, CPM simbolizava "festinha de pais", encontros alegres quando a escola comemorava alguma data. Estava enganada. Na salinha apertada, as mães reuniam-se em volta de uma mesa circular, algumas cadeiras e um computador. Explicaram como funcionava o sistema de auxílio ao recreio: todas as manhãs desciam ao pátio por 15 minutos e ajudavam a manter um mínimo de equilíbrio em toda aquela energia liberada pelas crianças, evitando brigas, protegendo os menores, afastando-os de possíveis quedas das árvores e muros, que teimavam em escalar. Levavam cordas e alguns jogos para os alunos brincarem, mas não podiam fazer nada mais, pois apesar de terem apresentado um projeto com brincadeiras à direção da escola, esta não o havia aprovado, mas também não oferecera nenhuma alternativa para distrair os alunos.
Com a mão na massa
No dia seguinte, comecei uma entusiasmada participação nos recreios diários.
Tornei-me uma das mães voluntárias, aumentando a carga das minhas já atarefadas manhãs. Minha filha sentiu-se segura ao ver minha presença no pátio e pediu para eu ir todos os dias. Logo, fiquei envolvida com as crianças e a tarefa de observá-las tornou-se uma rotina na minha vida. Não vigiava apenas a minha filha, mas os filhos de outras mães que não podiam ou não queriam ali estar.
Na verdade, esta não é uma "obrigação" dos pais, mas tendo em vista que o sistema educacional público está em declínio, por inúmeras causas (a econômica é apenas uma delas), os responsáveis pelas crianças têm que mudar sua maneira de enxergar a escola. Ela não é apenas um "depósito" onde se larga o aluno, esperando que a instituição eduque-o sozinha. Tem que haver participação da comunidade, interesse constante dos pais na situação de seus filhos quanto ao aproveitamento e crescimento como indivíduos e cidadãos.
Logo depois, tornei-me 1a. Secretária do CPM e entrei para o Conselho Escolar.
Minha ligação com a escola aprofundou-se. Certamente, muitos dirão que não têm tempo para serem tão atuantes (mas trabalho dentro e fora de casa, não tenho marido nem empregada doméstica para dividir tarefas), porém acredito que seja uma questão de estabelecer prioridades: considero a educação e a segurança da minha filha extremamente importantes!
O QUE É UM CPM
Segundo o artigo 12, inciso VI da Lei Federal nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996:
Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de:
VI - articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola;
É reconhecido um Círculo de Pais e Mestres em cada estabelecimento de ensino estadual e, entre suas atribuições, além do que diz a lei acima, estão:
- auxiliar os órgãos assistenciais e instituições existentes na escola em suas carências;
- colaborar na conservação e recuperação normal do prédio e equipamentos da escola;
- prestar serviços à escola em benefício dos alunos ou do processo educacional;
- representar os interesses dos associados perante as autoridades constituídas, buscando entre outras questões, a melhoria das condições físicas da escola, dos seus recursos humanos e técnico-pedagógicos;
- estimular a transformação da escola em centro de integração e desenvolvimento comunitário.
O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE/FNDE/MEC) repassa anualmente recursos em dinheiro para escolas, através do CPM. Isto é, essa verba somente será recebida pela escola se a instituição tiver um CPM em atividade. Então, a associação realiza uma assembléia com a comunidade, onde serão escolhidas as prioridades para as quais esse dinheiro será destinado. É mais uma forma de ajudar a escola!
Legenda das fotos:
1) Ísis e eu, com o crachá de Mãe Voluntária.
2) No pátio, durante o recreio, as crianças e eu.
3) Festa Disco, realizada pelo CPM no Dia dos Pais: da esq. p/a dir.: Berê (Pres.), Zilda (Vice), Rudha (aluno) e eu (1ª Secretária)
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3 comentários:
Nossa, Vera, que máximo! Essa lei sobre CPMs vale apenas para escolas públicas? Digo o conceito de pais ajudando na administração da escola, não as verbas, claro.
Parabéns pelo trabalho.
Silvia, qualquer escola pode (e deve) ter um CPM. Na particular você vai ter o trabalho facilitado e poderá "soltar muito mais as tranças"...
Vera,
Sabe, eu já tinha lido teu post e fiquei preocupada em relação à escola pública. Matriculei meu filho na escola estadual este ano, para ele cursar o Jardim B, depois de 3 anos estudando só em creches particulares. Confesso que tenho medo do que vou encontrar pela frente.
Beijos
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